segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Viajar por São Miguel ,com Daniel de Sá.


Queridos, venho registrar em Pasárgada meu passeio favorito: Ilha de São Miguel - Açores, pelas mãos abençoadas de nosso mestre e amigo Daniel de Sá.

Dar as mãos a Daniel, e deixar-se conduzir, é adentrar na essência da Ilha. É ir além. Enxergar aquilo que os olhos não podem alcançar, mas o coração pode sentir, e nossa alma mudar. É um mistério! Um verdadeiro encantamento!
Desejo a todos: Boa viagem. E ao condutor: Meu agradecimento de alma. E peço licença para não soltar a sua mão.

Do Nordeste à Povoação

O viajante esquece a beleza triste dos povoados por que passou. Tinham todos a cor dos dias cinzentos do Inverno. Como se nunca houvesse sol durante o dia nem luar nas longas noites. O que aquela gente sofre por estar viva! Há em todos, no entanto, uma delicadeza natural, uma boa educação que lhes anda agarrada à alma como as urzes e as queirós nas ravinas mais inacessíveis. Muitos anos mais tarde, até os lavradores e o gado, entre pasto e pasto, hão-de passear por caminhos de asfalto. E a beleza triste e cinzenta dará lugar a um permanente arraial de cor. Desde a Salga, com os seu jardins de caleidoscópio, até à apoteose da Vila do Nordeste, o viajante há-de surpreender- se com as flores à beira dos caminhos, nas casas e nos quintais, ou mesmo cobrindo os troncos de palmeiras na Fazenda.
Passando a ribeira dos Caimbos, num longo rodeio pelo sopé do Lombo Gordo, o viajante muda de concelho. Mas a paisagem não sabe disso, e permanece igual. Montanhas à direita, o mar à esquerda. Ravinas, arribas, precipícios. Sempre entre o susto e o sonho. Vem aí Água Retorta, ou vai-se por aí a Água Retorta, que dá as boas-vindas a quem uma légua atrás entrara no concelho da Povoação. Se fosse ave ou vento, teria andado metade disso somente. E, sendo a terra tão enrugada, tão áspera para caminhar nela e tão suave para nela pôr os olhos, acaba-se a pique sobre o mar, onde cai volteando a água de uma ribeira que, por ser assim, recebeu nome e o deu ao povoado. Um povoado que parece dois. Porque em terra chã fica o núcleo à volta da igreja, que é de Nossa Senhora da Penha de França, e mais acima se desenvolveu outro, obedecendo aos declives do lugar.
O viajante não sente cansaço, porque cada recanto visto é um prémio para a longuidão da jornada. Mais outra légua, chega à estrada que desce para o Faial da Terra. Caminho que é de ida e volta, e que se torce e retorce para não ser quase vertical. E de repente a terra se faz plana, pequena fajã que uma ribeira atravessa dividindo o povoado em duas partes. Voltando as costas ao mar, pode parecer que se está numa aldeia dos Alpes. E as ondas não precisam de se elevar muito para respingarem a terra que ali lhes fica quase resvés. Um pouco mais de ânimo, e podem até acabar como que ajoelhadas à porta da igreja de Nossa Senhora da Graça.
Por entre os montes que encaixilham a paisagem, uma dúzia de casas às quais o tempo esvaziará de gente e as intempéries se encarregarão de esventrar, de cegar as janelas, de escancarar as portas. É o Sanguinho. Mas aquelas casas hão-de ser depois recuperadas, reabilitadas, calafetadas, electrificadas, canalizadas. Para fingirem ser o que eram em condições de bem receber turistas. Não importará, porque a natureza há-de permanecer igual e milenar. Viver ali só poderia ter sido ideia de poetas, de eremitas ou de pobres.
(De um texto para um livro turístico a publicar pela Ver Açor.)

6 comentários:

Anônimo disse...

very cool.

Elisabete disse...

Cris,
Vi aqui, descrito com realismo, uma parte da "minha ilha". Conheço bem esses lugares e bateu-me a saudade, que não me larga nem um minuto.
Obrigada, por este momento.
Beijinhos atlânticos

Cris disse...

Querida Elisabete
São Miguel é um lugar mágico,com certeza,mas quando descrita pelo olhar de Daniel,seus detalhes são realçados e ganham um sentido muito especial.Ele faz isso com paixão,e isso é contagiante.Também tenho esta saudade que não me larga, e já a acomodei em meu viver.
Eu é quem agradeço a visita e por partilhar o passeio.
Beijos no coração.

Anônimo disse...

Olá Cristina achei ótimo seu blog.
Parabéns.Bjos

Cris disse...

Olá Clóvis
É com imensa alegria que recebo sua visita em Pasárgada.
Precisamos conversar querido,eu adorei conhecê-lo.Espero que considere que aquele fora um dia atípico.Não sou tão chorana assim ok? Só um pouco.Então,conheceu o texto do Daniel,e já vou contar ao Daniel que fazes aniversário no mesmo dia que ele.
Beijos meu querido.

Anônimo disse...

Que belas companhias me apareceram aqui, seja Deus louvado! Obrigado.
Conheço tão pouca gente de dois de Março, que é um grande prazer saber deste novo amigo. Pio XII também era deste dia, e foi eleito Papa em dia de aniversário.