quarta-feira, 29 de abril de 2009

Tenho estado fora da lei...






Parecer alegre e feliz agora é uma obrigação social, simples como tomar banho.


Temos que pedir permissão para sofrer ou esgotar a dor.


E há uns pesquisadores que acreditam ter descoberto a pílula da felicidade.


Agora compreendo porque estão liderando as vendas.É proibido sofrer...


Até concordo que não deveríamos perder tantas coisas,e que desmoronamentos de castelos são complexos,ainda que tenhas escolhido a implosão.


Perder dói, ás vezes mais do que deveria, não há como não sofrer... Acontece que a dor é o sistema imunológico da alma, ela aciona nossos mecanismos de defesa, e sempre saímos um pouco mais fortalecidos após enfrentar as tragédias. E ainda que seja devastador o sofrimento,ele sempre será proporcional as nossas forças internas,o sistema é perfeito.


Não quero as tais pílulas.Olha aonde chegamos,vendem nas farmácias felicidade sintética.


E agora também descobri que fizeram vários manuais para facilitar nossas vidas, tem um para ganhar dinheiro,outro para atrair a tal felicidade amorosa,outro para modelar seus pensamentos,para entender sua cara metade,e assim vai,tem para tudo,uns até prometem te ensinar a pensar,achei o máximo esse.


O problema é que se fosse eficaz,nunca mais venderiam os tais manuais.São construídos com o mesmo princípio dos medicamentos,arrume um lado e detone outro, assim a farmacologia garante sua sobrevivência.
Não vou pedir licença para sofrer, a dor é minha, e com ela me ajeito. Que venham as multas, desde já, deixo bem claro que não as pagarei,vou protestar.


E não quero que me desejem lucidez para fazer escolhas certas, preciso apenas manter minha força para recomeçar e consertar quantas vezes for preciso.


Deve ser por essa razão que gosto tanto das colchas de retalhos, elas nunca são iguais, e sua maior beleza está naquilo que não combina ou não faz sentido. Entretanto, as mãos que coseram os retalhos carinhosamente, usaram algum parâmetro, ou simplesmente o acaso. E esse é o verdadeiro sentido, o ato da criação. E quem pode julgar o ato da criação?
Não quero uma pílula, preciso de um abraço... Não quero um desses manuais, preciso ser ouvida, assim coloco essa dor para fora e olhando-a de frente, torna mais fácil o duelo. Não preciso de julgamentos, minha consciência já tratou desse assunto. Não preciso de lucidez, já implodi o castelo, preciso de um vendedor de sonhos, ou quem sabe um fertilizante de imaginação, ou que alguém me passe à conversa, assim ficará mais fácil esperar a cicatrização, enquanto não posso juntar os destroços.


Já pensei em jogar o dardo no mapa,e esse seria o lugar onde daria um tempo para a poeira baixar,mas temo que o dardo caia em meio a alguma guerra,e não costumo jogar o dardo duas vezes,é uma questão de ética pessoal.Nesse caso é melhor não arriscar com o dardo.


Já arrisquei com as dinamites e errei no cálculo na área de proteção,até agora não sei se estava muito próxima,ou se a carga foi violenta demais.O que sei é que causou estragos.E algumas estruturas que não estavam na lista de detonação ficaram abaladas.


Fazer o que? Agora já foi. Não há o que fazer... É preciso esperar a poeira baixar, e ver o que dá para reestruturar. Enquanto isso...se alguém conhecer um vendedor de sonhos, favor avisar...Peça-o para seguir a nuvem de poeira,certamente chegará em Pasárgada...

3 comentários:

Daniel disse...

Cristina
O Camões também recusaria essa pílula. De certeza que te lembras disto:
É ferida que dói e não se sente;
É dor que desatina sem doer"

Cris disse...

Transforma-se o amador na cousa amada,
Por virtude do muito imaginar;
Não tenho logo mais que desejar,
Pois em mim tenho a parte desejada.
Se nela está minha alma transformada,
Que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si somente pode descansar,
Pois consigo tal alma está liada.

Anônimo disse...

Eu também gostaria de comprar sonhos, Cris, mas um apenas me bastava:viver com a minha família e os meus amigos num espaço telúrico lavado de água impoluta, e de verduras, e de asas em cânticos pelo céu e pelas árcores, e que fosse tudo tão intenso, que nunca a morte nos pudesse maltratar.

BEIJINHOS DA LIA