quinta-feira, 25 de junho de 2009

Amigo







Não posso acreditar! Quanto tempo! Nossa !!!!Como sinto sua falta!
O que foi?
Não está lembrado de mim?
Impossível!
Não fica me olhando desse jeito. Diga algo gentil.
Hum! Vindo de ti, é sempre bom ouvir isto.
Já conhecia o sul da ilha?
Acho que tem razão. Por essas bandas o vento entra na ilha afobado.
Moro logo ali.
Posso passar um café e assar pão de queijo, enquanto conversamos um pouco.
Preciso muito conversar contigo.
Hei, não faz assim! Não precisa defender-se de mim.
Lembra:Eu te amo, porque te amo.???
Seja gentil. Confesse que veio, porque também senti saudades.
Assim me encorajas a continuar o assunto e a querer passar o café.
Desde quando essa azia?
Tudo bem. Vamos fazer do seu jeito.
Quem sabe se sentarmos ali?
Dá para ver o mar e ficamos abrigados do vento.
Por que não vai tirar o sapato? Tenta, é gostoso por os pés descalços na areia.
Ainda mais nesta areia fina e branquinha.
Tudo bem faça como quiser.
Não pretendo aumentar a distância que nos separa.
Não, não estou deprimida, estou angustiada é diferente.
Não tente adivinhar, tenha um pouco de paciência.Espere.Posso explicar o quanto aprendi a assimilar a ausência.
- Como a dor é inevitável e o sofrimento opcional?
- Não dê os ombros para mim, parece um menino birrento, não sou eu quem está com sapatos engraxados na areia, e ainda com esse lenço nas mãos tentando limpar o inevitável.
Ao menos aprendi a não lutar contra o impossível.
Não me faça rir agora, vou perder o tom dramático da conversa, e a oportunidade ímpar de falar contigo.
Sim. Lá adiante é a Ilha do Campeche.
Possui uma praia paradisíaca e vários sítios arqueológicos.
Está tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.
Não. Nunca cheguei até lá senão com o pensamentos. Ando praticando essa técnica. Estou graduada amigo.
Drummond será que pode parar de limpar os sapatos e prestar atenção um instante sem me interromper?
Não estou ficando brava.
Estou fazendo um pedido. Não vai demorar e sei que vai anunciar que meu tempo acabou e não consegui nada mais do que tentar convencer-te a me ouvir.
Sinto-me como uma criança que apanhou uma surra sem o menor espaço para argumentos.
Não, não é sempre assim, nem sempre quem bate tem razão.
Quer dizer: Nem sempre apanhamos por merecer.
Por favor, deixe-me ao menos concluir minha introdução, aliás, ela era bem melhor, não contava com suas interrupções.
Nossa como eu estava com saudades, meu querido rabugento!
Espera. Pensei em algumas frases histéricas, surreais, elas ajudam, trazem à tona a vontade de chorar.
É difícil manter-me no tom dramático contigo a me olhar assim com estes olhos de quem já sabe o que vou dizer.
Adoro quando abre esse sorriso tímido para mim.
Devias sorrir mais,ficas com olhos de menino.
Não, não vou falar de amor e não quero discutir política,ou papo cabeça. Embora amigo, estamos praticamente sem opções. Os partidos estão descaracterizados.
Não é ético citar nomes, não me complica.
Deus? Nem me fala amigo, descuidou-se novamente, enviou-me um anjo da guarda carioca, tenho negociado, mas, não estou com muito crédito.
Como é um anjo da guarda carioca?
É um bom anjo, o problema é que atrapalhasse facilmente, adora futebol, se tem jogo, não conte com ele, se tem sol, vai à praia, se chove, não sai de casa, e se está frio fica debaixo as cobertas,e ainda finge estar deprimido. Está rindo porque não é o seu anjo. Sabe o que ele fez comigo?
Trouxe-me uma carta. Estava assobiando.Imaginei logo: Vem confusão.
Sabe o que tinha dentro?
Um amor Drummond. Dos bons. Aqueles antigos, entende?
Aqueles que vem para ficar. Que desarruma a vida.
Por quê estou reclamando? Simples. A carta chegou com muitos anos de atraso.
E ele só entregou a minha. Essa cartas costumam ser pares. Ou seja,ele perdeu a outra e não se envergonhou disso.
Não, não fale assim! É um bom anjo. É estagiário, dá um desconto. Ele andava trabalhando no Rio, e foi mandado para o Sul.
Promoção? Não sei. Deve estar se recuperando do stress.
Espere, ainda não falei o que precisava.
Por que está olhando as horas?
Estás de carro?
Posso te dar uma carona.
Onde quer ficar? Sei. Não fica longe daqui.
Podemos conversar enquanto te levo.
Como sabia que esse era o meu carro?
Não achei graça. Chega de limpar os sapatos.
Espere um pouquinho. A porta não abre por fora.
Amassados são como rugas, contam histórias.
Não pretendo fazer plástica no meu carro.
Você tem que ter calma. Ele sempre pega.
Não, não vai precisar empurrar.
Dê um tempo a ele. Sim é pequeno por fora e espaçoso por dentro.
A que horas parte o seu trem?
Sendo assim, ainda temos uma hora e meia.
Viu, pegou! Fica calmo! Não vou bater, estou vendo, posso fazer esta manobra de olhos vendados.
Não vou correr, estamos cheios de radares e ainda tem os radares móveis, nunca sabemos quando vamos ser pego,é prudente não arriscar.
Também estou feliz de estar contigo.
Adoro quando me olhas desse jeito.
Não liga o rádio, ainda não conversamos.
Quero falar de uma máquina moderna.
Deixa eu explicar. É como aquelas de escrever, parecida com as eletrônicas, lembra? Só que nesta você não precisa arrancar a folha quando muda o curso do pensamento, ou quando os dedos erram as teclas. Basta apertar o delete, é uma tecla que apaga os erros, ou permite que mude o rumo do pensamento. Sim. Ela é passiva.
São inúmeras as vantagens.
Pode interagir com o mundo inteiro, estar sempre atualizado, e até saber o rumo de um míssil no instante em que fora lançado. Ah, também pode amar pessoas que nunca viu. Que não conhece o cheiro, a voz, os traços, também tive essas dúvidas no começo.
Não fale assim comigo!Não estou louca!
Esquizofrenia ainda não catalogada?
Gostei dessa. Mas, não gosto deste teu olhar desconfiado.
Preciso reclamar desta máquina, só um pouco, depois eu mesma a defenderei. Ela roubou as tardes de sábado, as caminhadas de mãos dadas, as cadeiras estendidas nas calçadas, às conversas na quitanda, os jovens na praça, os flertes, aqueles olhos nos olhos. As idas ao cinema. Como podes duvidar do que falo?
Namoram pelo Orkut, MSN ou emails.
Calma. Se não conhece, não pode falar assim comigo.
Parei porque estou aqui pensando se vou mesmo te levar a estação.
Quem é que falou:
Quando o homem atingir este nível de cultura estarei morto!
Quem é que indagou: Agora os homens fazem amor pelo sem fio?
Sabe o que aconteceu? Fazem amor por esta máquina.
Através dela pode ser quem quiser. Há um monte de super-homens nesse meio.
Nunca falham.
Não gostei da piada. Não teve graça. Estou brava, preciso reclamar, pensei que pudesse me entender.
Como assim? Eu não faço isso. Fico com as falhas.
O namoro anda em extinção, agora as pessoas ficam.
Já estou indo.
Não me culpe. É o trânsito, cada vez há mais carros. A Ilha está ficando pequena. E nem estamos na alta temporada.
Olha, aqui é a via expressa sul. Lá adiante há um túnel. Quer parar um pouco?
Não estamos longe. Ainda há tempo. Ficar? Não sei bem. É um direito conquistado, pode beijar e ficar com quantos quiser numa noite.
O que é isso? Não fale assim. Não falo de profissionais, é comum e cuida porque no lugar da tal censura, agora há processos se alguém for ofendido moralmente.
Será que consegue perceber como estou?
Não há salas de cinemas nas ruas, elas foram transformadas em Igrejas Evangélicas, e por lá tem uns corretores de imóveis do céu. Se tiver um poder aquisitivo alto, consegue garantir uma boa casa com piscina meu caro.
Eu não. Está gozando da minha cara não é?
Quando chegar minha hora, vou procurar o pessoal do MST.
Não, não quero falar sobre o movimento dos sem terra.
Vamos continuar a falar da máquina.
Olha lá à sua esquerda.
Esta ponte é nova. Aquela está interditada, é a Hercílio Luz, dizem que ainda vão recuperá-la, mas entra governo e sai governo e isso não acontece. Sim, é uma pena.
Olha lá em cima á direita. Hospital de Caridade. Foi o primeiro hospital de Santa Catarina, inaugurado em 1789. Em 1994, um incêndio destruiu 70% da área construída. Foi uma tragédia, lá estava abrigada grande parte da história do Estado.
Foi privatizado.
Aqui é o mercado Público. Sim. Eram aqui que os comerciantes da Ilha vendiam peixes, carne de sol, os grãos, mandioca, hortaliças, enfim.
A maioria eram escravos de ganho, forros e brancos pobres.
Estamos em cima do aterro, o mar alcançava até ali onde estão as lojas hoje.
Por favor, pode pegar minha bolsa?
Preciso de um cigarro.
Está bem eu aguento mais um pouco.
Já estamos chegando à Beira-Mar.
Partilhamos à mesma opinião: Há algo aqui que não conseguimos descrever, é preciso sentir.
Estou te olhando, porque vou te deixar aqui, e meu coração já está apertado.
Chega mais perto, quero falar baixinho ao pé do ouvido: A máquina apaga sem deixar rasuras. Consolo-me em saber que ela sempre dependerá de um homem para apertar o botão.
Chegamos.
Ah, estou olhando porque não temos trens em Florianópolis.

15 comentários:

Anônimo disse...

kkkkkkkkkkkk
Cumadre, amei a carta, fiquei imaginando tudo, vc e Drumond andando de Twingo...kkkk Ele segurando no puta merda...kkkkkkkk Reclamando da sua lata de coca e do seu cigarro.
Vc não existe. Muito legal, esta é aquela carta que vc já havia escrito a algum tempo, porém acrescentou algumas coisas.

Ficamos muito felizes qdo vc aparece.

Beijos...

Lu

Cris disse...

Olá minha amada.
Também fico muito feliz em estar com vocês.Muito feliz mesmo.
Sim.Essa é uma das cartas.Sei que gostam delas.Estou achando que o tempo de reescreve-las voltou,fazer o que? É bem mais seguro escrever cartas para Drummond.
Beijos para meus três amores eternos.

Anônimo disse...

Cris
Sei como é fazer esse passeio.
Estar com você é mergulhar numa nova dimensão.
Tenho pena de quem não recebeu a segunda carta, alguém perdeu algo?
Não foi você menina.Acredite.
Quem poderia pensar em trem em Florianópolis?
Presta atenção:És a criatura mais doce,linda e inteligente que conheci em toda a minha vida.
Sua sabedoria transcende e assusta.
E não sei como consegui manter o equilíbrio com essa alma tão sonhadora.Definitivamente não pode ser desse planeta.
Tudo o que conversamos ontem,todas as respostas deitam nesse texto lúdico.Sua força assusta-me.
Sem dúvida és minha escritora favorita.
E sua voz é sensualidade pura.
Passaria o resto dos meus dias ouvindo-a se fosse possível.
Cris és apaixonante por natureza.
Não conheço outra mulher tão completa,não duvide.
Não sofra ou perca tempo com quem não te merece.
Pasárgada está linda e aconchegante,espelha sua alma.
Beijos menina...
PS.Como faço para ter uma janelinha vermelha com o meu nome?
E.M
Beijos

Cris disse...

Querido amigo Edson
Você exagerou...Mas,um bom exagero.
Fico feliz que te sintas assim aqui em casa.Pasárgada agradece.
Precisa aparecer mais vezes, as flores gostam.
Beijinhos

Cris disse...

Edson
Desculpa.
É que você exagerou e fiquei assim atrapalhada.
Nunca perdemos tempo quando amamos, é quando a vid torna-se realmente vida,ainda que o anjo tenha esquecido de entregar a outra carta.Ainda que não tenha tido a felicidade de dar uma carona para Drummond(risos)
Acho que entendeu não é?
Mas tenho um amigo que vai de sapatos engraxados andar na praia ao meu lado,e fica ali limpando o inevitável.Disconfia do Twingo,e ainda não aprendeu a beber coca cola sem gás.
Um conselho:Quanto a ser sua escritora preferida,leva-me a concluir que tem lido pouco amigo,posso te ajudar nisso.
Agora mesmo é que vou pirar o cabeção,estou lendo Flaubert.
E ainda tenho os dezesete volumes da divina comédia pela frente.E tenho que aprender francês,Québec aguarda-me.
Para ter a tal janelinha vermelha,precisa criar uma conta no gmail,é simples.
Agradeço pelo dia de ontem,e por tanta ternura.
Um monte de beijos.

Mauro disse...

Agora sim!! Está chegando mais perto da mulher que é realmente, sorridente com a vida e gozadora. Idade de mudança...ou será mudança de idade????
Até o dia marcado.
Bjs!!!!

Elisabete disse...

"Um amor Drummond. Dos bons. Aqueles antigos, entende?
Aqueles que vem para ficar. Que desarruma a vida."
Um amor de quem gosta de "perder o chão", não é?
Eu também gosto.
Beijinhos

Anônimo disse...

Querida Cris,

Depois de me ter enternecido com este teu texto, fico à espera de um bocadinho do teu tempo para me dares notícias.

Beijinho da Lia

Anônimo disse...

Cris,

Vai ao Luar de Janeiro.

LIA

Anônimo disse...

Olá minha querida sombra colorida e iluminada,
Não é apenas o Edson que tem você como a escritora predileta. Eu há mais tempo que ele tive o privilégio de ler seus textos, sejam eles contos ou poemas. Sempre quando acordo, corro para Destino Pasárgada para ver o que você escreveu, para me alegrar ou sofrer, junto com suas palavras.
Fico imaginando o lançamento de seu livro. Alias, quando será? O Mauro tem razão: sua teimosia não deixa. Mesmo assim terá que pagar esta divida.
Beijos
Augusto

Cris disse...

Anjo
Não sei se vou mudar muito.Já perdi as esperanças de que um dia vou crescer(risos)
A vida é uma viagem em festa,tudo depende do lado que olhamos para ela.
Um monte de beijos.Até o dia marcado.

Cris disse...

Elisabete
Sim aqueles dos bons que vem para ficar,pena que meu anjo tenha perdido a outra carta,caso contrário receberia poemas como aquele de Flaubert.
O luar de janeiro foi perfeito,deixou-me sem ar,e perdi o chão na leitura.
Obrigada minha querida por existir.
Um grande beijo

Cris disse...

Augusto meu querido poeta.
Estou sem palavras.
Sabe que ainda não estou pronta para lançar um livro.
Esses textos são uma brincadeira de existir.Gosto de estar neles.
Sabe mais do que ninguém o quanto sou crítica comigo mesma.
Obrigada pela força.
Um grande beijo em seu coração,e perca o chão.

Anônimo disse...

Minha querida Cristina.
Você sem palavras? (risos) Você é muito critica com você mesma, mas se não estivesse pronta tanto eu como seus admiradores (que são muitos e verdadeiros) não colocaríamos você nessa gelada. Sabe por que está pronta para seu livro? Justamente por você estar em seus textos. Eles são você: lindos, verdadeiros; prontos para serem lidos e emocionar aqueles que os lerem.
Ah, quanto a perder o chão, vou perder, sim, mas antes vou comprar um para-quedas (não sei se tem ou não hífen)
Beijos
Augusto

Cris disse...

Lia minha for linda
Vou escrever.
Um monte de beijos