
Passamos da metade do ano... E apenas hoje,me dei conta disso.
Estou aqui, novamente aceitando o convite para uma partida de xadrez.
Preferia mil vezes a suavidade de uma valsa, porém, tenho estado longe dos salões.
Lembro-me vagamente de algumas promessas e planos que fiz ao me olhar no espelho um pouco antes de mudar o calendário.
- Tudo bem... Fico com as pretas. Vou jogar na defesa.
Não sei se o tempo está passando rápido demais ou tenho andado com o freio de mão puxado.
Onde estão as mudanças?
Gente perder dói muito... Dói pra valer.
Não falo de uma partida de xadrez.
Perdi coisas essenciais que faziam com que os meus dias fossem bordados num tecido especial.
-O abraço de domingo. Ah o abraço de domingo! Significava: Estou aqui.
Como tem sido difícil amanhecer aos domingos!
- As flores do campo. Por Deus, como sinto falta da doçura das flores do campo! Elas traduziam: Eu te amo... Você é especial.
Olho para o tabuleiro... O que estou fazendo?
Deixei meu cavalo mais vulnerável do que meus piões. O bispo humilhado e a torre rachada. Não consigo concentrar-me.
Estou concluindo que junto com as flores desapareceram as surpresas, as canções, aqueles telefonemas fora de hora e relâmpagos, os emails coloridos, os bilhetes, os corações desenhados no embaçado do espelho.
Os livros silenciaram... E o coração de tão quieto parece morto.
Grito com a minha rainha: Amar é contra lei. Você está perdida. Ninguém deseja uma rainha com emoção. Concentre-se e cuide de seus passos: pretos e brancos.
Ignoro o seu olhar de decepção. Aceito a partida para continuar em movimento.
Não sei por onde andei todo esse tempo... A única certeza que tenho, é que ando em descompasso com o destino. E que preciso de um novo caminho, pois a poesia agoniza no tabuleiro, o sonho enfraqueceu. Percebo que vou desaparecer com eles.
Conheço os acenos dessa vida previsível.
Estou em xeque... Já não me importo.
Ainda posso prolongar a partida.
Enxergo claramente o tabuleiro, vejo a poesia escorrer pelos olhos do rei, tão vulnerável e sonhador... Faço silencio. Duas manobras e estará liquidado.
Esqueço as lágrimas do rei vencido,
Prendo meu olhar insistentemente na esquina onde dobraram as últimas flores, rezo baixinho na esperança que acorra um milagre... que o destino volte a sorrir pra mim.
Preciso acreditar que uma hora dessas, vou ouvir os sinos, vou ganhar uma nova “nossa” canção, versos quentes sussurrados ao pé do ouvido, que reapareça o bruxo dos meus sonhos de menina, que surja em brasas o cavalheiro dos meus pensamentos insano, um convite para pescar siri, andar descalça na areia, tomar banho de chuva e namorar.
Aguardo o olhar, aquele olhar que devolve a vida, que faz com que um dia seja diferente do outro.
Que te faz contar as horas, brigar com o relógio, dirigir cantando, tecer versos de madrugada, ou planejar uma viagem.
- Xeque-mate... Que diferença faz???
Eu ainda creio em milagres.